sábado, 4 de maio de 2019

Sábado sem história

Depois de participar de uma oficina de escrita criativa e entender que escrever não é questão de inspiração e sim de prática, passei a ficar uma hora por dia, todas as tardes, criando no computador.

É sábado. Trabalhei na biblioteca até meio-dia. Chego em casa, almoço  e corro com a faxina. Às 15 horas, estou liberado.

“Sobre o que vou escrever hoje?”

Abro o notebook e me lembro: “São as palavras que conduzem o texto.”

Começo a digitar o título:

“A”

Alguém bate à porta.

Atendo.

- Pois não?

- Boa tarde, senhor! Sou, Wagner, representante da Hino...

- Aceita um copo d’água?

- Aceito.

- Só um minuto.

Encosto a porta. Entro. Pego o copo d’água. Levo ao vendedor. 

- Muito obrigado

Ele bebe com vontade. É um outono atípico, de muito calor.

- Aceita mais um pouco?

- Obrigado! Estou satisfeito. O senhor conhece os produtos da Hino...

- Imagina! Eu pego mais.

- Senhor, não precisa...

Já estou dentro de casa.

Pego a garrafa d’água. Encho o copo. Ele toma. Pego a garrafa de novo...

- Não. Não. Não... Aaaaaah!!!

Encho pela terceira vez.

Ao terminar, ele dá um passo para trás, antes que eu possa encher seu copo novamente.

- Não aguento mais. Estou satisfeito. 

- Ok.

Ele estica o braço para me devolver o copo. Pego.

- Então, senhor...?

- Paulo.

- Senhor Paulo...

- Só Paulo, por favor.

- Ah, desculpe. Então, Paulo, você conhece os produtos da Hino...

- Só um minutinho que eu vou guardar o copo.

Entro. Encosto a porta. Volto trazendo um saco de biscoito de polvilhos e umas paçocas de rolha.

- Wagner, trouxe umas coisinhas pra você comer. Sei que andar o dia todo na rua dá muita fome. Eu mesmo quando trabalhava na companhia de energia elétrica...

Conto minha história enquanto ele come biscoitos e paçocas. O segredo para se livrar desses vendedores é falar mais que eles.

Quando percebo que ele está com dificuldade de engolir pela secura dos alimentos, é o momento de questioná-lo:

- Faz tempo que você trabalha com esse produto?

- (...)

Ele tenta responder e engasga.

Bato nas costas dele.

- Vou buscar mais água.

- Nããããããoooooo...

Quando volto com a segunda garrafa d’água, o vendedor já foi embora.

“Finalmente vou poder escrever”.

Já são 16 horas.

Recomeço a digitar o título. O notebook desliga.

Corro e abro a gaveta. A conta de luz foi paga.

Saio na rua. A vizinha que tudo sabe, tudo vê traz a notícia:

- Acabou a energia da rua toda.

Na esquina, há um caminhão da companhia de energia. A mesma que trabalhei e contei a história para o vendedor. 

Parece castigo.

- Tem previsão de demora, amigo?

- Daqui uma hora a energia volta.

Entro à procura de um lápis, uma caneta, um papel.

Encontro o papel. Mas e as canetas? Lembro que emprestei o estojo para o meu sobrinho brincar e só Deus sabe onde ele deixou.

Fico agoniado. Escrever é uma necessidade para mim.

“O celular, claro!”

Pego o celular. A bateria está acabando.

Resolvo fazer um café. No fogão. Não há energia para usar a cafeteira.

O café dá certo. Pelo menos isso. Volto para a rua. Sento na porta de casa. Fecho os olhos. Tento meditar...

“Piiiiiii...”

O microondas apita. A energia está de volta.

Entro na cozinha e ao olhar a hora me dou conta que cochilei sentado na porta.

“O que a vizinha vai dizer?” 

- Certeza que fumou erva.

Ela que pense.

Ligo novamente o notebook. 

“A”

Quando vou digitar a segunda palavra, a porta abre.

- Oi amor, vai tomar banho que a gente vai sair.

Salvo o “A” e desligo o computador. 

Desculpem leitores, mas, hoje, não tem história. 

Segue lá no INSTA: Paulo Sergio












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